"O amor quer o monopólio das faculdades da alma." Schiller

domingo, 11 de julho de 2010

Eu deixarei que morra em mim o desejo

de amar os teus olhos que são doces

Porque nada te poderei dar senão a mágoa

de me veres eternamente exausto

No entanto a tua presença é qualquer coisa

como a luz e a vida



E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto

e em minha voz a tua voz

Não te quero ter porque

em meu ser está tudo terminado.

Quero só que surjas em mim

como a fé nos desesperados



Para que eu possa levar uma gota de orvalho

nesta terra amaldiçoada

Que ficou sobre a minha carne

como uma nódoa do passado.

Eu deixarei ... tu irás e encostarás

a tua face em outra face



Teus dedos enlaçarão outros dedos

e tu desabrocharás para a madrugada

Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu,

porque eu fui o grande íntimo da noite

Porque eu encostei a minha face

na face da noite e ouvi a tua fala amorosa



Porque meus dedos enlaçaram os dedos

da névoa suspensos no espaço

E eu trouxe até mim a misteriosa essência

do teu abandono desordenado.

Eu ficarei só

como os veleiros nos portos silenciosos



Mas eu te possuirei mais que ninguém

porque poderei partir

E todas as lamentações do mar,

do vento, do céu, das aves, das estrelas

Serão a tua voz presente, a tua voz ausente,

a tua voz serenizada.



Vinícius de Moraes

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